quarta-feira, 14 de setembro de 2022

BOCA SUJA

 

BOCA SUJA

 

Minha mulher fica fula de raiva quando recheio meus textos de palavrões, sacanagens e similares.

Alega contrariada, que esses escorregões devem-se a minha infância de “quase  moleque de rua”, e apesar das orientações que recebia em casa, a influência  das ruas foi mais marcante.

Convem esclarecer, que na época da minha infância não existiam “meninos de rua” da forma que estamos acostumados a ver, nas esquinas, nos sinais, esmolando ou vendendo doces e balas.

Em Piracicaba havia poucos carros, o índice de criminalidade era praticamente zero, conhecíamos todos os bêbados, os loucos, as prostitutas e até o gays(que eram raros). A molecada era a verdadeira dona das ruas, que era utilizada para todos os tipos de brincadeiras, até mesmo para rachas de futebol.

A inexistência da televisão fazia que procurássemos nossos amigos nas ruas, permitindo uma perfeita integração, sem distinção de classe social, cor, religião, ou qualquer outra coisa.

Éramos apenas meninos.

Talvez já tenha contado essa passagem em outro texto qualquer, porem sempre me vem a memória, principalmente nos momentos em que são evocados os meus velhos laços de “street kid”.

Foi nos idos de 1954/1955, quando seria inaugurada a famosa “Casa Portuguesa”, na rua Governador, próximo a Treze de Maio.

Essa casa comercial seria a maioral em artigos para casa, cristais importados, talvez cama, mesa e banho, a ultima palavra em novidades para o lar. Coisa fina e chique(como se dizia).

Aguardávamos com ansiedade a inauguração, pois conhecendo o filho do dono que também perambulava pelas ruas, sabíamos que haveria farto comes e bebes.

Na tarde do grande evento, casa lotada de convidados, autoridades, padres e bispo, lá estávamos nós, eu, Toninho Pretinho, Zelão, Milton Gambá(e seu inseparável sobrinho de uns 5 anos), e mais um ou dois que não me recordo.

Naqueles bons tempos não havia esquema de segurança, mas mesmo assim, sempre aparecia um empregado para nos botar para fora, pois mal surgia um garçon e já o cercávamos, atacando as bandejas sem pudor.

Minutos depois, voltávamos sorrateiramente até nova expulsão, num circulo vicioso até nos empanturrarmos.

Bons e inesquecíveis momentos, somados a tantos outros vividos numa realidade, que aos meninos de hoje, pareceria ficção cientifica ou pré-história.

Obviamente nas ruas, jogando futebol e convivendo com os mais velhos, aprendíamos todos os tipos de sacanagens, com as celebres ilustrações das revistas suecas, o sonho de todo jovem e a “mãe das masturbações”.

Essas influências, sem duvida moldaram boa parte do meu caráter e libido.

O caráter pode ter melhorado com o passar do tempo, graças ao esforço dos meus pais, com a instrução, mas o libido e o secreto gosto por palavrões e sacanagens permanecem latentes e imutáveis.

Realmente tenho muito mais prazer quando escrevo sobre coisas mundanas, besteiras, sacanagens puras, do que quando escrevo sobre corrupção e as sacanagens espúrias de nossos políticos.

Como sou patrulhado por minha mulher, tento não cometer muitos excessos, mas não consigo resistir a um palavrão ou uma expressão chula.

É o  lado “menino de rua” que insiste em aflorar.

Sou um boca suja assumido, mas tenho e tive amigos que me botam no chinelo.

Perto deles, meu linguajar é franciscano.

Cito o querido Norberto, já falecido e o Tácio, que apesar de sua aparência de noviço, era e ainda deve ser, um poço de obscenidade e sacanagens.

Basta prestarmos atenção na conversa dos jovens de hoje, inclusive das moçoilas, para ficarmos de cabelos arrepiados, pois é um tal de porra pra cá, caralho pra lá, escroto, viado, corno e outros adjetivos qualificativos desse mesmo naipe, que fariam nossos avós morrer de vergonha.

Repito, sou um boca suja, mas como dizia o inesquecível personagem criado por Chico Anysio, pau d’água, cujo nome não recordo, noiva da Biscoito: “Sou, mas quem não é?”

 

José Roberto- 05/07/12

 

NOTA; PARA CUMPRIR COM MEUS DEVERES DE DONO DE CASA, SEGUINDO ORDENS DE DONA REGINA, VOU AGORA CEDO AO SUPERMERCADO. POR PREMÊNCIA DE TEMPO, REPLICO UM TEXTO SAUDOSO, DOS MEUS BONS TEMPOS DE MOLEQUE, EM PIRACICABA, QUE RESULTARAM NO ZÉ ATUAL.

 

JOSÉ ROBERTO- 14/09/22

 

 

 

2 comentários:

  1. Nada melhor do que recordar a nossa infância. Principalmente nós que já passamos dos setenta. Os jovens de hoje não conseguem ter a infância que tivemos nas ruas. Não podem nem sair com os sues celulares. Aprendem tudo na escolas e em circuitos fechados. Tem amigos da minha filha, que só abrem a boca com palavrões. Cada um pior que o outro e uns até que não entendo. Por isso, é bom lembrar de Ataulfo Alves: Meus Tempos De Criança
    Canção de Ataulfo Alves
    Eu daria tudo que eu tivesse
    Pra voltar aos dias de criança
    Eu não sei pra que que a gente cresce
    Se não sai da gente essa lembrança
    Aos domingos, missa na matriz
    Da cidadezinha onde eu nasci
    Ai, meu Deus, eu era tão feliz
    No meu pequenino Miraí
    Que saudade da professorinha
    Que me ensinou o beabá
    Onde andará Mariazinha
    Meu primeiro amor, onde andará?
    Eu igual a toda meninada
    Quanta travessura que eu fazia
    Jogo de botões sobre a calçada
    Eu era feliz e não sabia

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    1. Querido Vandeco
      Muito bom como sempre. Que saudades da professorinha...
      Abcs.
      Gima

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