OITENTÃO

 

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   OITENTÃO

 

Completo hoje oitenta anos.

Passaram tão rápidos que quase não percebi, pelo menos em minha mente, ao contrário do que dizem minhas juntas, que vivem reclamando por falta de lubrificação.

Quando penso, como acontece neste exato momento, fico meio zonzo, pois não sinto que já se passaram tantos anos, embora olhando no espelho caio na real, concordando comigo mesmo, a contragosto, que embora difícil de aceitar, não sou mais aquele Beto de outrora, com excesso de vigor e testosterona, embora, apesar das rugas, manchas e da pele ultra sensível, ainda esteja em razoável forma.

Chato constatar que já não sou o mesmo nas quadras, embora continue competitivo, não gostando de perder, todavia não chego mais nas bolas difíceis, nas curtinhas, que meus impiedosos adversários insistem em me brindar; me canso mais rapidamente, mas não desisto, e fungando tento chegar onde não posso.

Meus adversários costumeiros, membros da nossa querida turma do tênis, não me dão colher de chá, querem vingar-se das antigas derrotas, mas preocupam-se ao me verem fungando, esbaforido em excesso. Tudo bem Zé?, dá um tempinho; vamos tomar água, e eu velho teimoso, finjo que está tudo em ordem, quando na real, estou cansado pra caralho.

Sou o decano da turma e com certeza o mais rançoso, todavia, como tenho idade suficiente para ser o pai de todos, são pacientes, tolerando minhas impertinências e meu jeito brusco de demonstrar afeto e rejeição.

Não sou daqueles que perdoam com facilidade e jamais daria a outra face, muito pelo contrário, quero distância dos que não foram éticos e honestos  em nossas relações.

A parte desagradável de ir ficando cada vez mais velho, é conviver com a ausência de amigos queridos, alguns especiais, que partiram prematuramente, deixando saudades perenes e ocupando um lugar também especial em meu coração.

Sou hoje um oitentão, e como já mencionei no texto que escrevi ao completar sessenta anos, “sou um testemunha ocular da história”.

Poucos viram o que eu vi!

Assombrado, acompanhei o nascimento da televisão, que em Piracicaba tinha hora especial para entrar e sair do ar, pois a torre repetidora de sinais, era controlada pelo dona das Lojas Guidotti, principal e talvez a única vendedora de aparelhos de TV; vi o homem chegar na Lua, a evolução da tecnologia; fiquei embasbacado ao receber o primeiro fax, em serviço; o desenvolvimento da telecomunicação, do celular tijolão, ao miraculoso aparelhinho que falamos vendo nosso correspondente cara a cara, milagres que aconteceram, superando as previsões que via nos gibis, revistas e livros, muito livros, lidos em minha infância e juventude, até os dias atuais.

O caipira do interior, formado, casando com uma bela caiçara, constituindo família, morando em Campos do Jordão, Atibaia, São Paulo e definitivamente no Rio de Janeiro, com três maravilhosos filhos, complementada com um casal muito querido e especial de netos. Roteiro pleno de uma vida feliz e normal, obviamente com algumas pedras no caminho.

Enquanto escrevo, recebo ligações dos manos e comprimentos dos amigos, com os quais, amanhã a noitinha, tomaremos uns drinks e degustaremos alguns acepipes.

Hoje a tarde, uma singela comemoração familiar, com Regina, filhos e netos.

Mantive durante todo meu trajeto, a mente ocupada, lendo bastante, acompanhando os eventos importantes no Brasil e no mundo, constatando infelizmente, que não soubemos escolher nossos políticos, e que pagamos o ônus por nossas péssimas escolhas, na desagradável expectativa de deixarmos uma herança pesada para nossos netos, pois os filhos já participam da nossa incômoda realidade.

Cabeça boa, saúde idem, e corpo relativamente bem para a idade.

E a vida que segue.

 

José Roberto- 20/05/25

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